A história de criação da Starbucks não é inédita, mas é certamente interessante: na década de 80, o jovem Howard Schultz trabalhava em uma empresa de utilidades domésticas de propriedade sueca. Foi um pedido incomumente grande de cafeteiras que o levou para Seattle, e a conhecer os proprietários da Starbucks, Gerald Baldwin e Gordon Bowker. Impressionado com a paixão dos parceiros e sua coragem em vender um produto que muitos julgavam que atrairia apenas um pequeno grupo de amantes do café gourmet, Schlutz convenceu os parceiros a contratá-lo como diretor de operações e vendas (um pouco parecido com a história do McDonald’s, não?).
Em 1985, Schultz deixou a Starbucks, quando suas idéias de cultivar uma experiência italiana para os amantes de café foram rejeitadas pelos fundadores. Mas ele acreditava na ideia, e logo fundou sua própria empresa, a Il Giornale. Em 1987, a Il Giornale comprou a Starbucks por $ 3,8 milhões de dólares, e Schultz se tornou seu CEO. A partir daí, a empresa cresceu: em 1987, a Starbucks tinha apenas seis lojas, em treze anos, a Starbucks tinha mais de 3.500 lojas e receita anual de US $ 2,2 bilhões. Nesse mesmo ano, Schultz deixou o cargo de CEO, certo de que ela tinha crescido o suficiente para continuar sozinha.
Mas o crescimento tinha que parar em algum momento. No início de 2007, Schultz escreveu um memorando para o sucessor de seu sucessor, Jim Donald, sobre o lento desaparecimento da empresa, que mais tarde vazou para a mídia. Nele, ele destacava algumas preocupações sobre os sacrifícios feitos em prol do crescimento (em dez anos, a empresa tinha ido de 1.000 a 13.000 lojas), principalmente a piora da experiência do cliente e a comoditização da marca. Ele também mencionou que a banalização da experiência tinha proporcionado que outras empresas, cafeterias e redes de fast-food, se inserirem em seu mercado. Logo depois disso, Schultz retornaria para o cargo de CEO.
Quando Schultz retornou à Starbucks em 2008, suas palavras se mostraram proféticas. Seu preço das ações havia caído 75% nos últimos dois anos e seus concorrentes, como o McDonald's e a Dunkin'Donuts, estavam corroendo as vendas e as margens tanto da parte inferior quanto da parte superior. Basicamente, embora a receita da Starbucks tivesse crescido nos últimos anos, ela dependia da abertura de novas lojas para crescer, enquanto em lojas antigas as vendas caíam.
Era o momento de agir. A empresa tinha perdido sua identidade, então em 26 de fevereiro de 2008, ela fechou todas as 7.100 lojas nos EUA por três horas, a fim de retreinar seus baristas. A Starbucks perdeu $ 6 milhões de dólares naquele dia, mas agora seus baristas podiam servir o “café perfeito”.
Embora tivesse cafés de qualidade, o preço de seus produtos sempre foi superior ao preço oferecido por cafés locais ao redor do mundo. Quando a recessão econômica chegou, em 2008, muitos de seus clientes optaram por opções mais baratas.
Quase todos os executivos foram demitidos na época, seiscentas lojas foram fechadas no ano, e outras trezentas no ano seguinte, quase sete mil funcionários foram demitidos.
"A liderança anterior culpou a economia e o custo mais alto dos laticínios pela queda nos negócios. Eles também declararam isso como uma razão para aumentar os preços.” Schultz comentou uma vez, mas a sua visão era diferente: "A empresa não deve apenas culpar a economia; Os pesados gastos da Starbucks para acomodar sua expansão criaram uma burocracia que mascarou seus problemas".

Nos dois anos seguintes, ele liderou a recuperação da empresa, com lucros triplicando de $ 315 milhões de dólares para $945 milhões em 2010. Isso era só o começo. Em 2019, a Starbucks tinha 31.256 lojas ao redor do mundo, e $ 26,5 bilhões de dólares em receita, sendo a terceira maior rede de fast-food do mundo, perdendo apenas para o McDonald’s e o Subway.
Como isso foi possível?
A ideia que Schultz tinha da Starbucks sempre foi muito claro: um lugar para apaixonados por café se reunirem. A Starbucks nunca ganharia seus clientes através do café mais barato, mas ele poderia conquistá-los com um senso de comunidade, de ser legal e popular. Quando voltou para a liderança da empresa, Schultz fez questão de voltar às origens.
Um exemplo famoso (e uma das grandes razões para muitas pessoas quererem ir nas suas lojas), de como a Starbucks usou o Branding a seu favor para aproximar do seu público, é os copos das bebidas, que passaram a receber o nome dos clientes, ao invés dos das bebidas, a partir de 2012. Seguindo a mesma linha de pensamento, os funcionários das lojas passaram a usar crachás de identificação.
Ainda em 2008, a Starbucks embarcou em uma estratégia orientada à tecnologia e inovação. Os funcionários foram encorajados a pensar livremente sobre a organização, contribuindo com ideias e se envolvendo no negócio. Logo, essa comunidade foi expandida: em março, foi lançada a My Starbucks Idea, onde clientes poderiam trocar idéias entre si e enviar sugestões para a empresa - desde dos produtos ao serviços, passando por layout, publicidade, responsabilidade social corporativa, músicas na loja e outros, a opinião do consumidor era bem vinda. Mais de 93.000 ideias foram compartilhadas por aproximadamente de 1,3 milhões de usuários nas redes sociais, e as visualizações de página por mês aumentaram para 5,5 milhões. Com ela, a empresa conseguiu entender as necessidades e preocupações de seus clientes, e aproveitou muito disso. A Starbucks implementou mais de 100 dessas ideias, gerando valor para aqueles envolvidos.
Outra estratégia foi criar cafés personalizados: a iniciativa My Starbucks Signature deu aos consumidores a oportunidade de criar suas próprias bebidas, nomeá-las, e compartilhar o novo sabor com a comunidade. Dessa forma, a Starbucks informou ao consumidor sobre a ampla gama de produtos oferecidos em suas lojas ao redor do mundo. A única modificação permitida na bebida de assinatura é na mistura e quantidade de ingredientes, ou seja, não poderia adicionar novos ingredientes - com isso ela conseguiu diversificar sem interromper a distribuição dos insumos, integrando a personalização em seus processos existentes.
É interessante destacar que essas estratégias poderiam dar dado muito errado: se a Starbucks não ouvisse seus clientes, a My Starbucks Idea teria falhado; se My Starbucks Signature desacelerasse os processos na loja, seu funcionamento estaria comprometido.
Além disso, Starbucks fez uso das mídias sociais para reacender sua marca. A empresa tinha uma certa onipresença nas redes, e as clientes começaram a se conectar ao redor do mundo nas redes sociais, criando grupos como o “grupo da internet grátis”, o “grupo do leite de soja”, os “amantes do frappuccino”. Com isso, a organização conseguiu construir uma base de fãs - os clientes usavam as plataformas online para expressar suas ideias, e confiavam que a marca estava os ouvindo. Ela se inseriu na comunidade de aplicativos muito antes de suas concorrentes. Seguindo a mesma linha das redes sociais, planejou seu aplicativos para atrair as massas e, especificamente, o segmento que compunha sua comunidade online. Com apps como localizadores de lojas, programas de informações e recompensas baseado em nutrição, ela integrou e aprimorou sua estrutura de comunidade de mídia social.
No entanto, a Starbucks nunca dependeu dos fãs para resolver seus problemas. Afinal, quando se trata de co-criação, a plataforma necessária depende muito do problema a ser resolvido. Ao tentar resolver um problema complexo específico como reduzir o desperdício gerado por seus copos descartáveis, a empresa reconheceu que a My Starbucks Idea não seria útil. Nesse caso, ela se reuniu com um público que se preocupava realmente com o assunto, à Mutopo, uma agência de cocriação social que reuniu um grupo de empreendedores com consciência ambiental e mídia social para solução desse problema.
A habilidade da Starbucks de usar a tecnologia para capturar idéias e sugestões de seus três principais públicos, seus clientes, seus funcionários e seus parceiros, criou valor para a empresa. Assim como a LEGO, a Starbucks usou a inovação como uma estratégia sustentável de criação de valor. A organização fez da ideia que cada cliente é uma parte interessada e muito investida na empresa, seu modo de vida.
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